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quarta-feira, janeiro 02, 2013

PPPs implica mudança nos comportamentos


12/09/12  Danielle Villela
Economista português Rui Monteiro em entrevista à Diagnóstico
Primeira unidade de saúde no modelo de parceria público privada (PPP) no Brasil, o Hospital do Subúrbio, em Salvador (BA), é um exemplo para os demais estados brasileiros, na avaliação do economista português Rui Monteiro, especialista sênior em PPPs do Instituto do Banco Mundial. Embora a PPP baiana tenha ganhado relevância internacional, o modelo ainda não foi adotado em outras regiões do país. “Não se pode dizer que algo tenha dado errado. Trata-se da maturação do processo de implementação de uma inovação contratual”, comenta ele, numa referência à baixa adoção do modelo pelo governo no Brasil. Com experiência no desenvolvimento de projetos de PPP para mais de 40 governos, Monteiro acredita que os serviços de assistência à saúde serão cada vez mais atribuídos ao parceiro privado. “A experiência mostra que os modelos de ‘bata branca’ geram importantes ganhos de produtividade”, argumenta. Em Salvador, onde visitou o Hospital do Subúrbio, o economista falou à Diagnóstico.

Revista Diagnóstico – Na percepção dos brasileiros, o Banco Mundial saiu de uma postura de quem dizia aos países emergentes o que eles deveriam fazer para uma outra, de ajudar a fazer. O que mudou?
Rui Monteiro – Essa percepção está correta. O que mudou é que o Instituto do Banco Mundial e, sobretudo, os países em desenvolvimento têm buscado crescentemente soluções que funcionam dotadas de racionalidade econômica. Sabemos bem que há várias estratégias de desenvolvimento possíveis, dependendo da vontade política de cada governo e da sua capacidade para implementar políticas públicas. Diferentes modalidades podem ser utilizadas na área das PPP’s, com maior papel do setor privado na provisão de serviços públicos ou apenas ligado a infraestruturas e serviços de apoio. Algumas modalidades permitem maiores ganhos de eficiência e qualidade, mas com maiores riscos políticos. Outras apresentam menores riscos políticos, mas com custo esperado mais elevado. O Banco Mundial, conhecendo experiências em muitos países, pode apresentar as vantagens e inconvenientes de cada modalidade para permitir uma decisão informada aos gestores de cada país ou estado.

Diagnóstico – Apesar de todo o incentivo feito pelo Banco Mundial às PPPs no setor da saúde, o modelo ainda tem participação irrisória no Brasil. O que deu errado?
Monteiro – Não se pode dizer que algo tenha dado errado. Trata-se da natural maturação do processo de implementação de uma inovação contratual complexa. Isso leva tempo, pois implica transformações nas instituições e no comportamento dos gestores públicos e privados. Convém aprender com as experiências existentes, no Brasil e fora do país.

Diagnóstico – Quais impressões o senhor teve ao visitar o Hospital do Subúrbio, na Bahia?
Monteiro – Quando comparado com unidades de outros países, o Hospital do Subúrbio está muito bem colocado em termos de instalações, equipamentos e funcionamento. Nas duas vezes em que visitei o hospital, pude confirmar a criação de virtuosos incentivos para que instalações e equipamentos sejam sempre adaptados às melhores condições de prestação de serviços e que assim sejam mantidos ao longo do contrato. Isto nem sempre acontece em hospitais não PPP, onde muitas vezes a boa vontade e o profissionalismo dos dirigentes e funcionários não são suficientes para ultrapassar os diversos obstáculos às mudanças necessárias.

Diagnóstico – Qual a sua avaliação sobre a experiência de PPP na Bahia e a repercussão do modelo em outros estados brasileiros?
Monteiro – Sendo pioneira no Brasil e relevante em termos internacionais, a PPP na Bahia terá um efeito de demonstração para outros estados brasileiros. O secretário da Saúde da Bahia fez uma aposta cuidadosa e firme em várias opções PPP, o que está dando resultados. Claro que ainda é cedo para balanços finais. A PPP é um contrato de longo prazo e seu sucesso depende também da gestão do relacionamento entre os parceiros. Essa gestão do contrato é mais que a tradicional supervisão do cumprimento das cláusulas, pois requer a busca conjunta de soluções para situações inesperadas, assim como a prevenção de estratégias privadas que possam lesar o interesse público.

Diagnóstico – Na Espanha, ao contrário da Bahia, houve uma forte reação do sindicato dos médicos à inclusão da gestão do corpo clínico no contrato de PPP. Como o Sr. avalia o modelo que exclui a “bata branca” da operação?
Monteiro – A experiência mostra que os modelos de “bata branca” geram importantes ganhos de produtividade, com forte crescimento da prestação de serviços e contenção do seu custo, se adequadamente contratados e geridos pelo poder público. Na Espanha, há PPPs de bata branca e outras apenas infraestruturais. Em Portugal, o modelo é de bata branca. Para isso, contribuiu a existência de uma modalidade que permite ao profissional público obter uma licença para trabalhar para um operador PPP obedecendo às regras privadas, mas mantendo seus direitos de funcionário público quando regressar ao setor público. Em vários países, a restrição ao modelo “bata branca” vem de limitações constitucionais ou do receio dos profissionais. Mas mesmo o Reino Unido, com mais de 60 hospitais PPP infraestruturais, está começando a contratar em modelo “bata branca”.

Diagnóstico – Para muitos especialistas do setor, o lobby da classe médica contra a inclusão dos serviços assistenciais nos contratos de PPP é o maior entrave ao avanço do modelo.  Pode comentar?
Monteiro – Creio que a principal dificuldade é financeira. As entidades financiadoras dos edifícios e equipamentos procuram proteger seus investimentos dos riscos de demanda ou de pagamentos associados à prestação de cuidados de saúde. Em longo prazo, os médicos têm interesse em modelos de PPP que permitam aos governos uma expansão sustentável da prestação de serviços de saúde e que simultaneamente ajudem no crescimento da produtividade no setor. No curto prazo, contudo, podem sentir alguma perda de poder ou regalias. Mas há exemplos de superação desses obstáculos, como o caso de Portugal.
Diagnóstico – No Brasil, pela atual lei das PPPs, os governos só podem investir até 3% da receita corrente líquida anual. O Banco Mundial entende isso como um entrave também?
Monteiro – As PPPs, em termos globais, podem criar dificuldades à fazenda pública, se não forem cuidadosamente programadas e orçamentadas. Alguns países europeus, com a atual crise financeira, estão sentindo o impacto de programas muito volumosos. As limitações existentes na lei brasileira são muito adequadas a uma fase inicial de experimentação e aprendizagem. Em uma fase mais avançada, podem ser aliviadas, de preferência compensadas por regras mais estritas de identificação e estruturação dos projetos PPP.
Diagnóstico – O Hospital do Subúrbio acaba de fazer uma compensação financeira prevista em contrato para o Grupo Prodal, que administra a unidade. Esse tipo de ajuste é comum em PPPs ligadas ao setor de saúde?
Monteiro – Não é possível, em uma PPP, prever todas as ocorrências que venham a afetar a vida do contrato. Alterações contratuais efetivamente acontecem, sob a forma de renegociação formal ou acerto financeiro. É extremamente importante que não haja acertos financeiros por riscos contratualmente alocados ao parceiro privado, mas é natural e até mesmo inevitável haver alterações nas condições financeiras relativas a ocorrências imprevistas, como alterações no volume de demanda esperada ou no tipo de serviços a serem prestados.
Diagnóstico – O governo da Bahia está partindo para um modelo mais complexo de PPP, na área de diagnóstico por imagem. Quais erros precisam ser evitados?
Monteiro – A PPP para diagnóstico por imagem está em fase de modelagem. Muitos erros precisam ser evitados ainda nesta fase e, depois, na gestão do contrato. Mas muitos dos “erros” que daqui a uns anos serão atribuídos aos contratos serão nada mais que “riscos” agora avaliados e assumidos. Contratar implica assumir alguns custos e riscos para obter benefícios esperados. Com base em uma análise cuidadosa e na experiência internacional, muitos erros podem ser evitados. É importante que qualquer governo utilize as diversas opções de que dispõe, seja PPP ou não, para oferecer serviços de saúde. Nesse processo, a única opção sem riscos é nada fazer, o que é moralmente inaceitável.

*Entrevista publicada na revista Diagnóstico, n°15.
Fonte: http://www.diagnosticoweb.com.br/noticias/gestao/para-especialista-do-banco-mundial-ppps-implica-em-mudanca-de-comportamento.html 

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